Vox nostra resonat
A guitarra na GalizaA música para guitarra no Arquivo Canuto Berea (3)
Isabel Rei Samartim

À morte de Sebastian Canuto Berea Ximeno em 1853 sucedeu-lhe o filho primogénito Canuto Berea Rodriguez ( , 2008, pp. 17-18). Ao falecer este em 1891, deixou como herdeiros a mulher Ana Rodrigo Garcia e os sete filhos, que fundaram a sociedade comercial Canuto Berea e Cia. por um período de 10 anos. Mas, diversos acontecimentos familiares aceleraram a formação duma nova sociedade em 1897 ( , 2022, p. 179).
A prolongação comercial de Canuto Berea Ximeno
Com diferentes conformações, a sociedade Canuto e Cia. chegaria até 1916, e depois continuaria Canuto Berea Rodrigo com a marca "Canuto Berea" até ao ano de 1931, em que faleceu. A empresa teria diversas conformações societárias até ao seu encerramento em 1985. Portanto, no que atinge à segunda metade do XIX, a empresa dos Canuto Berea estaria nas mãos de Canuto Berea Rodriguez entre os anos de 1853 e 1891 e nas de Ana Rodrigo e filhos até ao final do século.
No tempo de Canuto Berea Rodriguez, o número de obras para guitarra conservadas no Arquivo Canuto Berea sofre um descenso acusado com respeito à primeira metade. O Arquivo conserva 101 obras para guitarra, das que 82 pertencem à primeira metade e somente 19 à segunda.
Entre ca. 1850 e ca. 1880 conservam-se as publicadas por
É importante termos em conta que o Arquivo Canuto Berea é um arquivo deficitário, quer dizer, as obras que conserva não foram acumuladas por colecionismo ou uso das partituras, como no caso dos fundos particulares de intérpretes profissionais e amadores, mas por terem ficado no armazém, ou seja, por não se terem vendido.
Colaboradores de Canuto Berea
Com Canuto Berea Rodriguez e o seu empregado, que depois seria sócio da empresa, Ferrin produzem-se sucursais nas diferentes cidades galegas.
A mesma autora também nomeia
Manuel Penela Asorey em Compostela
Manuel
Rosa Conde dedicou a loja à venda de partituras, à promoção dos compositores e intérpretes galegos, à apresentação de novidades musicais e a acolher aulas de música no seu local. Assim, em 1886 vemo-la participando na venda dos abonos para o Teatro Principal, situado na frente do seu estabelecimento, onde tocariam o sexteto
Em 1893 volta a anunciar a venda de partituras, neste caso, as da zarzuela La africana (El Alcance, 1893). São os tempos em que Nemésia Curtier (sic) e María Álvarez levam as medalhas de ouro e prata nos prémios extraordinários da Sociedade Económica compostelana (
José Cardalda Castro, também em Compostela
Em 1881 documenta-se em Compostela a loja de música do republicano José Cardalda Castro que achamos em diferentes localizações. Em fevereiro desse ano está na Porta do Caminho, n.º 27. Esse deve ser o mesmo endereço que o das Casas Reais, n.º 27, que se indica em abril. Já no mês de setembro figura como armazém na rua Nova, n.º 22, frente ao Teatro Principal (Gaceta de Galicia, 1881a, 1881b, 1881c) e, finalmente, na rua da Caldeiraria, n.º 40 (Programa, 1885). Nesse mesmo ano o pianista
Em 1890 o jornal El País publicava o retrato de José Cardalda junto com uma nota de reconhecimento pela sua militância política. Segundo este jornal, Cardalda teve um papel importante no estabelecimento da 1ª república, fez parte da Junta revolucionária de Compostela com
O episódio de rivalidade comercial com Canuto Berea, na sucursal de Manuel Penela, não consta que tenha existido por diferenças políticas. Sem negar que estas pudessem existir, a teor do acontecido também no Ferrol, o caso atribuímo-lo à ambição do industrial corunhês, às regras da oferta e da demanda, à pura concorrência, possivelmente desigual, por abranger o mercado da música em Compostela.
Houve rivalidade comercial entre Berea e Cardalda (Lopez Cobas, 2007, pp. 317-319), e graças a isso vemos que Cardalda tinha vendido instrumentos a Felipe Paz de Vila Garcia, que pensamos seja o compositor e regente Felipe
O Bazar Helénico da Ponte Vedra
António Garcia e um tal Quintana abrem em 1888 o Bazar Helénico, situado no n.º 1 da rua Oliva, na Ponte Vedra. Desde o começo anunciam-se como "comercio de instrumentos de música y obras de fundición" (Crónica de Pontevedra, 1888). Já no ano a seguir publicam anúncios duplos, pelos que na mesma loja podem adquirir-se partituras para piano e tubos de pedra mica para o alumiado de petróleo e gás (El Látigo, 1889). Suspeitamos que os instrumentos que começou a vender António Garcia seriam do comércio de José Cardalda em Compostela que, segundo temos dito, tinha intenção de lhos vender a um tal "García de Pontevedra", citando a carta dirigida de Gaos a Canuto Berea no contexto da espionagem comercial que mantinham (Lopez Cobas, 2007, p. 318).
No mês de junho de 1903 o Bazar Helénico expõe para venda uma guitarra com o ressoador Terraza, um dos primeiros amplificadores de som para guitarras clássicas. A notícia diz que "el aparato es muy curioso y adquiere mucha sonoridad resultando muy útil para conciertos" (La Correspondencia Gallega, 1903). Já se percebia que o instrumento não tinha o volume sonoro que se estava a exigir nas cada vez maiores salas de concertos.
O sistema de ressonância Terraza, que consistia em várias peças de madeira colocadas em contato com as varetas internas e o tampo dos cordofones, recebia esse nome do seu inventor, o bandurrista valenciano
Sucursal de Canuto Berea na Ponte Vedra
É já o século XX quando temos constância da sucursal de Canuto Berea e C.ª na Ponte Vedra, sem nada a ver com o estabelecimento de António Garcia. Em 1903, mesmo ano em que o Bazar Helénico expõe o amplificador de Carlos Terraza, começa a anunciar-se Canuto Berea na imprensa e em 1904 os anúncios indicam que a sucursal se acha na rua do Comércio, n.º 41 (El Diario de Pontevedra, 1903a; 1904). A hemeroteca documenta até ao ano de 1913 a sua existência, quando publicita o concerto de pianola que teria lugar o dia 5 de dezembro daquele ano, a cargo de Mariano
El Sr. Puig, conocedor profundo del piano-pianola e inteligente músico, nos puso de relieve todas esas cualidades tocando admirablemente entre otras piezas un fresco paso-doble de Aceves, el Rondó caprichoso de Mendelsohn y la 12 Rapsodia de Listz.
Como vem sendo habitual nesta época, a publicidade do armazém de Canuto Berea está orientada ao piano e à música para piano. Mas, como na Ponte Vedra os instrumentos de corda eram de uso frequente, entendemos que Berea, igual que no resto de lugares onde anunciava e vendia, mantinha o comércio de guitarras e cordofones de plectro. Confirmam isto as várias partituras do guitarrista
Referências citadas
- Cancela, Beatriz e Alberto (2013). La saga Courtier en Galicia. Compostela: Alvarellos Editora.
- Crónica de Pontevedra. (1888). Ponte Vedra: 19 de julho, p. 3.
- El Alcance. (1893). Compostela: 17 de julho, p. 2.
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- El Diario de Pontevedra. (1904). Pianos. Ponte Vedra: 29 de outubro, p. 3.
- El Diario de Santiago. (1876). Gacetillas. Santiago de Compostela: 9 de junho, p. 3.
- El Látigo. (1889). El submarino "Peral". Tubos de piedra mica. Ponte Vedra: 15 de agosto, p. 4.
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- El Progreso. (1913). Una hora agradable. En el Liceo-Casino. Ponte Vedra: 6 de dezembro, p. 3.
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