Vox nostra resonat
A guitarra na GalizaMais guitarristas em Ourense (2). A ditadura franquista
Isabel Rei Samartim
No Carvalhinho, em agosto de 1921 (El Correo de Galicia) realizavam-se durante dous dias serenatas de verão onde participavam um “nutrido” grupo de plectro e um coro. Também em 1928 se convocava um Certame de Coros Galegos em que a obra obrigada era o Alalá e Alvorada de . Esta obra tinha sido arranjada em 1926 para orquestra de plectro pelo guitarrista, pianista e compositor ativo em Vigo, Gomez (Rei-Samartim, 2020, p. 1630).
Um exemplar deste arranjo foi achado como propriedade do guitarrista Evangelino Vazquez, partitura que foi roubada do seu dono e conservada no Museu da Ponte Vedra. Recentemente foi interpretada na apresentação do livro (maio de 2023), com a história d@s músic@s que sofreram morte e perseguição durante a ditadura franquista.
Em
1933 também se regista em Lóbios, no contexto do final do ano letivo das
Missões Pedagógicas, a atuação dum grupo de plectro de Entrimo, formado por
crianças e dirigido por Ricardo Dominguez (Galicia,
1933). Já sabemos da escultura com guitarra na igreja de Entrimo, do século
XVIII. De facto, essa vila deu, passado o tempo, vários guitarristas que
marcaram dum ou doutro modo a história da guitarra em Ourense: o virtuoso
Santiago Vazquez, de morte prematura, José Luís Gonzalez Pena, regente de
grupos de plectro nas instituições franquistas e primeiro professor interino do
Conservatório, e também Evencio Baños, descrito pelo jornalista Manuel
Fernandez como “notável bandurrista” (La
Región, 1968d).
A guitarra em Ourense durante a ditadura
Já
durante a época da Guerra da Espanha e depois a ditadura franquista, a
apropriação espanhola da guitarra que tinha começado no final do século
anterior, intensificou-se de maneira bem evidente. O jornalista franquista
Victor
Ruiz
também visitou os seus amigos Faustino
Para esse fim serviam as instituições como a Frente de Juventudes, a Juventude de Acción Católica, a Falange e a Sección Femenina, instituições com grupos de plectro ativos em Ourense nas décadas centrais do século XX. Um exemplo deste controle cultural é a descrição realizada pelo guitarrista e regente da orquestra do Frente de Juventudes, José Luís La Región , na entrevista do jornal (1951a).
Nessa
descrição vemos que Pena era regente da “rondalla” da Frente de Juventudes desde o seu início em 1948, que constava de 23
pessoas com as variações típicas da formação, que os membros deixavam de sê-lo
aos 21 anos, e que estava formada por oito bandurras, quatro alaúdes, dous
bandolins, seis guitarras, dous violinos e uma flauta. O agrupamento, que
ensinava os membros a ler e tocar música, tinha sido campeão
provincial por três vezes no concurso da Frente
de Juventudes franquista.
Pena
afirmava que em três anos passaram pela orquestra umas 200 pessoas e expressava
a vontade de formação musical para futuras orquestras de plectro ourensanas. O
seu repertório, dizia, incluía música clássica e espanhola, além de Beethoven,
Haydn e Rossini. Na altura, tinham realizado cinco recitais em Ourense e
apresentavam-se aos certames que se organizavam. Por último, Pena dizia que na
época havia seis orquestras de plectro na província de Ourense.
Um
dos locais habituais para os concertos era o Coliseu Xesteira, bem como o
Teatro Principal ou o Paço Episcopal de Ourense. Também há notícias sobre a
atividade destas orquestras franquistas em Ribadávia, no Cinema “España” (La Región, 1951b), e de recitais
organizados pelo pároco em Couso de Salas (El
Pueblo Gallego, 1963).
No
Carvalhinho, em primeiro de abril de 1955 decorria o “Dia de la Victoria” no
Teatro-Cine Alameda (La Región, 1955),
dia em que o ditador e seus seguidores no governo comemoravam a vitória da
ditadura. Atuava o grupo de plectro da Frente
de Juventudes onde, entre as obras clássicas habituais, se incluía um
arranjo de Gonzalez Pena para orquestra de plectro da obra Algueirada gallega de
Durante
a segunda parte do século XX realiza-se a implementação paulatina do ensino
musical regulamentado pela lei franquista. O Regime legislava para os
conservatórios em 1942. Mas, em Ourense o conservatório não seria estabelecido
até 1958 (Iglesias, López e Miguéns, 2008). Já desde 1950 o intelectual Isidoro
Guede instava ao presidente da Deputação de Ourense a fundar uma Escola de
Música com aulas de vários instrumentos, entre eles, a guitarra (La Región, 1950). Como vemos, nem sequer
a difícil ditadura franquista teria acabado com o empenho galego pela guitarra,
por mais que a propaganda insistisse em fazer do instrumento um símbolo
alheio à Galiza.
Contudo, na década de 1960 a Sección Femenina continuava a oferecer aulas de guitarra (La Región, 1964), ao mesmo tempo que se criava a cátedra de guitarra em Ourense (El Pueblo Gallego, 1964) ocupada de forma interina pelo já citado José Luís Gonzalez Pena e se anunciavam cursos de guitarra CCC por correspondência (Hoja de los Lunes, 1964).
Em 1958 acontecem dous eventos importantes: a primeira é a fundação dos cursos de Música em Compostela e a segunda, ligada a estes, é a criação do Conservatório de Ourense organizado como fundação onde participavam diversas entidades, coordenadas através do Padroado. Em ambos os eventos estava a figura do bem posicionado Álvarez (1918-2011).
O Concurso de Interpretação de Ourense
Nesse
contexto é que se cria em 1960 o Concurso Internacional de Interpretação do
Conservatório de Ourense, cuja primeira edição seria dedicada ao piano e a
segunda, à guitarra. No total o concurso teria treze edições entre 1960 e 1972,
dedicando seis ao piano (1960, 63, 66, 67, 69 e 71), duas à guitarra (1961 e
68), duas ao violino (1962 e 72), uma ao canto (1964), uma ao violoncelo (1965)
e uma à música de Beethoven (1970). Vejam-se nas referências citadas ao pé do
artigo os exemplares de La Región
entre 1960 e 1972.
Em
20 de de março de 1961, no contexto do concurso dedicado à guitarra produz-se a
conferência-concerto de Regino
A organização e disposição dos participantes provinha dos cursos de La Región , onde se realizava a primeira fase do concurso, acontecendo em Ourense a segunda fase, ou final, com a concessão dos prémios (, 1959). Por isso, a comissão organizadora e os membros do júri eram pertencentes ao professorado de Música em Compostela. Assim, nas edições de 1961 e 1968, dedicadas à guitarra, o presidente do júri foi sempre La Región , tendo participado, entre outros, o guitarrista australiano e o compositor suíço (, 1961c).
Em 1968 também fizeram parte do júri o secretário de Música em Compostela, violinista e musicólogo catalão e o compositor castelhano Federico (La Región, 1968c). O próprio António Iglesias participou de todos os júris em todas as edições do concurso. Ao longo dos anos foram criados prémios com diferente dotação económica, provenientes de diversos fundos particulares e bancários. A segunda vez que o concurso foi dedicado à guitarra, em 1968, foi criado o Prémio , uma bolsa de estudos para continuação do estudo da guitarra na honra do guitarrista ourensano (La Región, 1968b).
Em 1971 entra como professor de guitarra no Conservatório o guitarrista valenciano El Pueblo Gallego , que mais tarde seria diretor do centro (Franqueira, 2015). Supomos que até então o professor interino teria sido todo o tempo o guitarrista de Entrimo, . A última vez que o achamos na hemeroteca é em 1974, quando o jornal anunciava a recepção dum vilancico para a paróquia de Nigrão, composto pelo ourensano José Luís Gonzalez Pena, que seria interpretado pela organista Clara Perez Vilas com um coro de meninas (El Pueblo Gallego, 1974).
Estas
informações foram incluídas no artigo intitulado “A guitarra em Ourense: um
instrumento galego”, recentemente publicado no número 40 da revista Ágora do Orcellón. Esta revista está
organizada pelo filósofo galego Avelino Muleiro e é editada pelo Instituto de Estudios Carballiñeses,
instituição do Carvalhinho dedicada ao estudo da cultura galega.
Referências citadas
- Ágora do Orcellón. Revista do Instituto de
Estudios Carballiñeses.
- Harper, Nancy Lee. (1998). Manuel de Falla. A Bio-Bibliography. London: Greenwood Press.
- El
Correo de Galicia. (1921). Carballino. Buenos Aires: 28 de agosto, p.
6.
- El
Pueblo Gallego. (1937). Agasajo de la asociacion de la prensa al
“Tebib-Arrumi”. Vigo: 28 de novembro, p. 15.
- El
Pueblo Gallego. (1963). Couso de Salas. Vigo: 4 de junho, p. 18.
- El
Pueblo Gallego. (1964). Se crea una catedra de guitarra en el
Conservatorio de Música. Vigo: 13 de setembro, p. 14.
- El
Pueblo Gallego. (1974). Villancico en exclusiva para la parroquia
de Nigran. Vigo: 19 de dezembro, p. 12.
- Franqueira Barca, Sergio. (2015). La agrupación guitarrística gallega y la guitarra en Galicia entre 1977-1984). Tese de doutoramento. USC.
- Galicia. (1933). Pequeñas Misiones Pedagógicas. Ourense: 4 de julho, p. 4.
- Hoja de
los lunes. (1964). [Anúncio] CCC. Vigo: 21 de setembro, p. 4.
- Iglesias, Xosé Manuel, López, Pilar e Miguéns, Juan Enrique. (2008). Conservatorio Profesional de Música de Ourense: 1957-2007, cincuenta anos de música. Ourense: Conservatorio Profesional de Música.
- La
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março, p. 4.
- La
Región. (1951a). Sobre la marcha. Ourense: 16 de março, p. 4.
- La
Región. (1951b). Rivadavia. Ourense: 27 de dezembro, p. 3.
- La
Región. (1955). El “Dia de la Victoria” en Orense. Ourense: 1 de
abril, p. 6.
- La
Región. (1959). El premio de interpretación del Conservatorio de
Orense será de los mejores del mundo. Ourense: 30 de dezembro, p. 3.
- La
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- La
Región. (1961a). El Concurso Internacional de Guitarra del
Conservatorio de Orense. Ourense: 19 de janeiro, p. 8.
- La
Región. (1961b). Interesante conferencia y magnífico concierto de
Regino Sainz de la Maza en el Aula de Cultura. Ourense: 21 de março, p. 3.
- La
Región. (1961c). El sábado darán comienzo en nuestra ciudad las
pruebas finales del Concurso Internacional de Guitarra. Ourense: 13 de
setembro, p. 3.
- La
Región. (1962). El Concurso Internacional de Violín organizado
por el Conservatorio de Orense. Ourense: 12 de setembro, p. 3.
- La
Región. (1963). Reunion del Patronato del Conservatorio de
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- La
Región. (1964). Juventudes de la Sección Femenina. Clases de
guitarra y rítmica. Ourense: 22 de janeiro, p. 3.
- La
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3.
- La
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- La
Región. (1966). El Concurso Internacional de Piano de Orense.
Ourense: 4 de setembro, p. 3.
- La
Región. (1967). Concurso Internacional de Piano del
Conservatorio de Orense. Ourense: 31 de março, p. 6.
- La
Región. (1968a). El Concurso Internacional del Conservatorio de
Orense está dedicado este año a la guitarra. Ourense: 4 de abril, p. 4.
- La
Región. (1968b). Noticia sobre el Premio “Santiago Vázquez”.
Ourense: 29 de agosto, p. 4.
- La
Región. (1968c). El Concurso Internacional de Guitarra. Ourense:
10 de setembro, p. 4.
- La
Región. (1968d). Entrimo. Ourense: 19 de setembro, p. 21.
- La
Región. (1969). Se convoca el X Concurso Internacional de Piano
del C. M. de Orense. Ourense: 20 de abril, p. 13.
- La
Región. (1970). El importe total de los premios asciende a
320.000 pesetas. Ourense: 2 de maio, p. 6.
- La
Región. (1971). El Concurso Internacional de Piano del
Conservatorio de Música de Orense. Ourense: 28 de maio, p. 7.
- La
Región. (1972). En el Concurso Internacional de Violín del
Conservatorio están representados diez paises. Ourense: 5 de setembro, p. 8.
- Músicarepresaliada. (2023). Ponte
Vedra: Deputação.
- Rei-Samartim, Isabel. (2020). A guitarra na Galiza. Tese de doutoramento. Universidade de Santiago de Compostela.
- Rei-Samartim, Isabel. (2023). A guitarra em Ourense: um instrumento galego. Ágora do Orcellón, 40 (119-147). Carvalhinho: IEC.
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