Vox nostra resonat
A guitarra na GalizaAs orquestras de plectro (6): Arousa e Redondela
Isabel Rei Samartim
Continua a relação de informações entre os séculos XIX e XX sobre as orquestras de plectro na Galiza, cuja eclosão no último terço do século XIX está bem documentada e a continuação durante o século XX está ainda em período de estudo. Neste artigo apresentam-se as notícias relativas às orquestras de plectro nas vilas de Rianjo, Vila Garcia e Redondela, que ainda sendo cidades pequenas, foram autênticos centros de atividade guitarrística naquela época.
De novo o FLMR
O
arquivo do Fundo Local de Música de Rianjo (FLMR) conserva obras para orquestra
de plectro do último terço do século XIX, possivelmente pertencentes a músicos
amadores que, em muitos casos, teriam dado os primeiros acordes durante o
estudo da carreira na Universidade em Compostela. A família do poeta
Do
trabalho de Arcos Moldes conservam-se algumas letras dos coros da sua autoria,
entre as que há jotas, passodobles, valsas, passaruas, maçurcas, galegadas e
música para grupo de cordofones da autoria do grande compositor galego, Filipe
Da
colaboração de Arcos Moldes e Paz Carbajal saem as Brisas Rianjesas, duas obras: uma jota e uma valsa, escritas para
coro de vozes, uma com acompanhamento de guitarras, e outra, de guitarras e
bandurras. Do mesmo compositor é a obra Consuelo
de las Flores, com letra de Arcos Moldes, e escrita igualmente para coro
com guitarras. As Brisas Rianjesas
tiveram no Entrudo de 1906 uma interpretação por parte do coro do mesmo nome,
para a que se publicou um folheto com as letras para cantar, na imprensa de M.
Suarez, em Vila Garcia.
Paz Carbajal e as orquestras de plectro
Filipe
Paz Carbajal, grande compositor de música galega para coro, banda, piano e
órgão (Varela, 2001), cultivou a música para grupos de cordofones dedilhados.
Por amabilidade do pianista Alejo
As
Brisas Rianjesas foram interpretadas
no passado mês de março pelo alunado da orquestra de guitarras do Conservatório
Profissional de Santiago de Compostela, no concerto realizado na Igreja da
Universidade, dentro dos eventos organizados pela EDLG do centro, e contou com
a presença de membros do grupo municipal rianjeiro e compostelano, e diversas
personalidades do mundo da cultura.
Também,
dentro do conjunto de obras para orquestras de plectro, no Fundo Local de
Rianjo aparece música com outras formações instrumentais, como a do passodoble
intitulado Jugando al toro, do
primeiro terço do século XX, que vemos arranjado para flauta, dois violinos,
duas bandurras, alaúdes e guitarras. A partitura está escrita em três
pentagramas e os instrumentos agrupados como segue: no primeiro pentagrama,
flauta, violino 1º e bandurras 1as, no segundo, violino 2º, bandurras 2as e
alaúdes, e no terceiro, as guitarras. Poderia ser a obra de Ricardo B.
Em Vila Garcia
Em
1893 o jornal El Lucense recolhia uma
nota breve em que se anunciava a próxima constituição em Vila Garcia duma banda
de música e uma “rondalla”, a qual poderia ser uma orquestra de plectro tendo
em conta a oposição semântica entre as palavras 'banda' e 'rondalla'. Seria a banda o lugar dos instrumentos de sopro, podendo
ser a “rondalla” o dos instrumentos de corda, de arco, de mão e de plectro, sem
por isso prescindir das flautas que tantas vezes se achavam nas orquestras de
cordofones.
Três
anos mais tarde, em 1896 o escritor Juan Fernandez Casal e o regente teatral
Ricardo Urioste organizavam outra orquestra, de novo chamada de rondalla, intitulada El Odeon, formada por moços da localidade
(Gaceta de Galicia, 1896). Em 1885
José R. Paratcha, editor, anunciava-se através da publicação do poema em galego
O amañecer de Juan Fernandez Casal
junto de outros dous poemas de autores diferentes, no jornal vilagarciano El Eco Comercial (1885). Um ano mais
tarde, a pianista vilagarciana Carmen Carrete Paratcha apresentava-se ao
certame de Tui em que também concorria o mestre Ulibarri, na especialidade de
violino (La Opinion, 1896). Estes
Paratcha, vilagarcianos e ligados à atividade musical, lembram o Lopez
Paratcha, dono do bazar onde se vendia música e instrumentos, que já se
anunciava na Ponte Vedra em 1897.
Com
a atividade guitarrística e de orquestras de cordofones documentada no último
quartel do século XIX nas vilas de Rianjo e Vila Garcia, não seria de estranhar
que as orquestras de cordofones na Arousa tivessem muito mais percurso antes e
depois da mudança de século do que puder parecer nestes breves apontamentos.
Em Redondela
A
maior parte das notícias musicais que temos de Redondela pertencem ao século XX
mas, como nas outras vilas galegas, é possível imaginar, antes da virada do
século, os grupos de cordofones a amenizarem as festas ou sociedades artísticas
com algum tipo de prática musical. No blog Anecdotario
redondelan referenciava-se a participação duma “rondalla” no mês de março
de 1896, no banquete de boas-vindas ao general Rubin, evento em que também
tocaram duas bandas de música. Pelo número de agrupamentos, parece ter sido
este um grande evento não suficientemente explicado na escassa informação. O
autor do blog situa no início do século XX o Centro Científico Desportivo que
existia em Redondela e dá mais informações sobre os agrupamentos posteriores
(Migueles, 2017).
Durante
o século XX, como grande parte das vilas costeiras galegas, Redondela
desenvolveu uma interessante atividade de cordofones. Maria Leboreiro publica
em 1997 uma Crónica gráfica em que
podem ver-se seis fotografias de agrupamentos com guitarras. A primeira e mais
antiga data do ano 1913, é um retrato de festa realizado na ladeira de um
monte, em que no ângulo mais alto figuram os músicos: um duo formado por um
violino ou rabeca, em qualquer caso um cordofone pequeno de arco, e o que
parece uma guitarra portuguesa, cítara ou cistre.
Além
desse primeiro testemunho, os grupos com guitarras/violas de que temos notícia
em Redondela datam entre 1933 e 1952. Na mesma Crónica há três imagens
apresentadas como da Agrupación Artística
Redondelana, que no ano de 1933 se retratava como agrupamento de cordofones
dedilhados com mais de trinta componentes e, em 1934, com mais de cinquenta. Em
ambos os casos todos os membros vestiam o uniforme da orquestra, o que indica
uma certa organização, além duma continuidade que, supomos, se teria visto
acabada em 1936. A quarta imagem, já pertencente aos anos de 1941-1942 responde
a um quadro de declamação, e a quinta é apresentada como um agrupamento
artístico no Entrudo de 1952, com os seus membros a vestirem de turcos. Todos
os grupos destacam pelo seu número, o cuidado das vestimentas e a invariável
presença dos instrumentos das orquestras de plectro.
Referências citadas
- Comoxo, Xosé e Santos, Xesus. (2016). Arcos Moldes. Mestre sen escola. O Rianxo do seu momento 1865-1944. Corunha: Deputação.
- El
Eco Comercial. (1885). “Variedades”. Vila Garcia: 26
de setembro, p. 23.
- El
Lucense. (1893). Lugo: 15 de junho, p. 3.
- Gaceta
de Galicia. (1896). “Desde Villagarcia”. Compostela: 4
de novembro, p. 2.
- La
Opinion. Diario de Pontevedra. (1896). “Certámen
musical de Tuy”. Ponte Vedra: 19 de julho, p. 2.
- Leboreiro Amaro, Maria A. (1997). Redondela, crónica gráfica dun pasado recente. Vigo(?): Promociones Rodriguez y Couñago.
- Migueles, Juan. (2017). “Orfeóns,Corais e Rondallas”. Blog Anecdotario Redondelán: 22 de janeiro. Consultado em 01/08/2019.
- Mundial
Música. (1919). “Sumario de los números publicados en
Mundial Música”. Valencia: n. 43, julho, p. 20.
- Rei-Samartim, Isabel. (2020). A guitarra na Galiza. Tese de doutoramento. Universidade de Santiago de Compostela.
- Santos, Xesus e Comoxo, Xosé (1994). Biografía de Arcos Moldes. (Rianxo: apuntes dunha vila mariñeira). 1865-1944. Rianjo: Câmara Municipal.
- Varela de Vega, Juan Bautista. (2001). “Felipe Paz Carbajal, un gran músico del XIX gallego”. Museo de Pontevedra(55), pp. 317-336.
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