Vox nostra resonat

A guitarra na Galiza

Mais tunas académicas galegas

Isabel Rei Samartim
jueves, 10 de octubre de 2024
Retrato de João Gualberto da Fonseca. Fonte: Diário Illustrado, 1888.  © 2024 by Isabel Rei Samartim Retrato de João Gualberto da Fonseca. Fonte: Diário Illustrado, 1888. © 2024 by Isabel Rei Samartim
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A hemeroteca galega demonstra, mais uma vez, ser um fundo informativo fundamental para reconstruir a cultura musical galega do passado. Quanto às Tunas académicas galegas, a hemeroteca é de valor inestimável, pois a bibliografia ao dispor é sempre fragmentada e incompleta, de maneira que cada um destes trabalhos vira mais uma peça a encaixar no grande puzzle dos relacionamentos entre Tunas galegas e portuguesas. 

Neste artigo apresentam-se informações sobre outras Tunas académicas galegas, algumas das quais tiveram também atuações em Portugal. As notícias galegas complementam as portuguesas, e vice-versa, desenhando um mapa geográfico diverso do estabelecido pela historiografia espanhola.

A Tuna Corunhesa

Tuna de Veteranos da Corunha. © by Facebook da Tuna de Veteranos.Tuna de Veteranos da Corunha. © by Facebook da Tuna de Veteranos.

Em 1885 existia já uma Estudantina no denominado Instituto da Corunha, que devia ser o que abriu em 1862 (Vazquez, 2012, p. 5). Essa estudantina realizou um concerto para a angariação de fundos pelas vítimas dos terramotos acontecidos na altura, na Andaluzia (El Correo Gallego, 1885a). A atuação realizou-se no circo que Vicente Mariani e Wolsi Casimir mantinham desde 1884 na praça de Maria Pita. Este era o Circo Coruñés desenhado por Juan de Ciórraga em 1877, que desde 1884 mantinha a instalação do circo equestre de Mariani e Casimir, e que em 1888 foi deslocado aos terrenos da Junta de Obras do Porto da Corunha (Villasuso, 2013, p. 392).

A quantidade doada pelo auditório foi de 7.249,75 réis, segundo as contas da comissão organizadora. Dous dias mais tarde, repetiriam a atuação com um outro percurso pela cidade, com saída e chegada ao Centro Recreativo, passando pela Câmara municipal e diversas ruas corunhesas (El Correo Gallego, 1885b).

No entrudo de 1887 a Tuna Corunhesa viajou ao Ferrol onde atuou várias vezes, dando o concerto de despedida em 6 de fevereiro, previamente ao baile de máscaras (El Correo Gallego, 1887). Em fevereiro de 1892 voltava ao Ferrol para atuar no Teatro Romea, onde representou um apropósito da autoria do presidente da tuna, Amador Fernandez Dieguez (El Correo Gallego, 1892). Em abril desse mesmo ano, celebrava um banquete no Hotel Continental. A notícia do banquete diz que a velada acabou numa briga com indivíduos que atacaram os tunos no passeio de Méndez Núñez com o resultado de várias contusões e guitarras quebradas (Gaceta de Galicia, 1892a). 

Depois disso na hemeroteca há um vazio de notícias sobre a Tuna Corunhesa até ao ano 1932, em que volta a atuar até 1963.

A Tuna Ferrolana

Tuna "Lucero del alba", de Neda, 1965. Fonte: German Castro. © 2024 by Isabel Rei Samartim.Tuna "Lucero del alba", de Neda, 1965. Fonte: German Castro. © 2024 by Isabel Rei Samartim.

Em 1884 organizava-se no Ferrol uma estudantina com mais de trinta moços que se preparavam para celebrar o Entrudo na vila de Noia (El Eco de Galicia Havana, 1884). Parece que a iniciativa tinha sido dos noienses, sendo aceitada por numerosos ferrolanos. As viagens da Tuna Ferrolana repetem-se no verão de 1888, em que atuam para angariar fundos com o motivo duma viagem a Betanços para as festas do São Roque (El Correo Gallego, 1888). O repertório incluía uma jota de João Perez, o violinista e regente ferrolano, um arranjo da Serenata de Schubert e um passodoble.

Além disso, na ocasião tocou um duo de violino e piano formado por Perez e Braña, também foi interpretada música para piano só e a representação de vários números teatrais. À volta das festas passaram pela Corunha onde visitaram as autoridades e tocaram pelas ruas. O presidente honorário, que os acompanhava era Wenceslao Veiga Gadea, jornalista e poeta (Gaceta de Galicia, 1888). A presidenta honorária era Leonor Pradenhes de Cubeiro. Seria João Perez o regente desta Tuna?

A Tuna Ourensana

Tuna Airinhos do Barco de Valdeorras, 1966. Fonte: Internet. © 2024 by Isabel Rei Samartim.Tuna Airinhos do Barco de Valdeorras, 1966. Fonte: Internet. © 2024 by Isabel Rei Samartim.

Há notícias desta Tuna desde 1877. A moda das tunas universitárias chegou cedo a Ourense, o que indica que em Compostela já deviam estar consolidadas em aquele ano. Em 1880, em Ourense organizava-se uma estudantina para o entrudo que anunciava um concerto de duas horas no Liceu Recreio Artístico (El Trabajo, 1880).

Em 1886 e 1887 a Tuna universitária preparava-se para realizar viagens a Portugal que, como se documenta desde os tempos do Padre Feijó, é destino natural para os guitarristas ourensanos e vice-versa. Em 1886 os trinta escolares que conformavam a Tuna Ourensana "elegantemente vestidos" foram primeiro a Verim e depois visitaram a vizinha vila de Chaves (El Correo Gallego, 1886a, 1886b). No brinde de Chaves participaram os senhores João Gualberto da Fonseca e José Maria de Carvalho. Em 1887 visitaram a cidade do Porto (Crónica de Pontevedra, 1887).

A Tuna Pontevedresa

A celebrada festa do Urco em 1876 é somente um exemplo da intensa atividade e laboriosidade das festas do Entrudo que se realizavam na Ponte Vedra. As Tunas, vistas como orquestras de cordofones formadas por estudantes vestidos com traje universitário, também eram uma forma de rusgas, mas constituídas de modo oficial e com estrutura administrativa.

A Tuna Pontevedresa, que tinha tocado no baile celebrado pelo Recreio de Artesãos da Ponte Vedra em fevereiro de 1895, anunciava uma próxima saída pelas ruas da cidade (La Lealtad Gallega, 1895). Um mês mais tarde tocava no teatro de Marim, sendo presidenta de honra a senhora Angela Taboada (El Eco de Galicia Lugo, 1895). Em 1897, também no entrudo, voltava a anunciar-se a organização da Tuna Pontevedresa desta vez com um objetivo muito concreto, o de angariar fundos para a Cruz Vermelha que se ocupava dos feridos nas últimas guerras coloniais (La Correspondencia Gallega, 1897):

Tuna pontevedresa. Estos días se advierte gran entusiasmo entre la juventud pontevedresa con motivo de la organización de una tuna compuesta de varios elementos musicales, tuna que tiene por único y exclusivo objeto allegar recursos para la "Cruz Roja" que destina sus productos para aliviar á los soldados enfermos é inútiles que regresan de las guerras coloniales á la madre pátria.
A este efecto recorrerá la tuna algunas poblaciones gallegas en los próximos carnavales, postulando á domicilio y celebrando á su vez amenas veladas en los teatros y sociedades recreativas.
Parece que habrá también un selecto cuadro de declamación dirigido por un festivo y conocido escritor de la localidad.
Todos los individuos que han de constituir dicha agrupación ostentarán como distintivo la "Cruz Roja".

Dias mais tarde a imprensa anunciava o início dos ensaios, indicando que era um conjunto de quarenta pessoas e que se nomeou uma Junta Diretiva. De novo, temos a constituição da Tuna em forma de associação para um fim determinado, cujas atividades eram os eventos programados com o indicado objetivo.

A Tuna Lucense

Esta é uma das mais antigas tunas universitárias galegas junto com a de Compostela e a de Ourense. O artigo precedente a este na secção A guitarra na Galiza alojada na acolhedora Mundo Clásico foi dedicado à Tuna Compostelana (primeira notícia em 1877, com suspeita de ter-se formado em anos anteriores). Entrementes, já foi tratada a Estudantina Lucense (fundada em 1878) no artigo dedicado a Montes e a sua relação com a guitarra. Aqui reunimos só alguns dados dispersos que complementam o descrito até agora.

É muito possível que José Castanheda, membro em 1878 da Estudantina Espanhola que foi a Paris, integrasse a Estudantina Lucense nesse mesmo ano. Também, o escritor, jornalista e poeta Aureliano José Pereira (1855-1906), autor da letra de duas das seis baladas de Montes (Lonxe d’a terriña e O pensar d’o labrego) foi presidente da Estudantina Lucense em 1892. No ano a seguir, 1893, Pereira publicava um artigo sobre Montes no El Regional, com motivo do prémio que recebeu na Havana. E em 1898, igual que no ano anterior fizera a Tuna Pontevedresa, a conhecida por orquestra do Casino de Lugo, que era a Estudantina Lucense, organizava um festival benéfico em favor dos feridos nas guerras coloniais.

A Tuna Viguesa

A duquesa de Alba, Cayetana Fitz-James Stuart, assinando sobre uma guitarra da Tuna do SEU de Vigo. Fonte: El Pueblo Gallego, 16 de outubro 1960, p. 1. © 2024 by Isabel Rei Samartim.A duquesa de Alba, Cayetana Fitz-James Stuart, assinando sobre uma guitarra da Tuna do SEU de Vigo. Fonte: El Pueblo Gallego, 16 de outubro 1960, p. 1. © 2024 by Isabel Rei Samartim.

Para o ano de 1892 anunciava-se a organização duma Tuna em Vigo, uma rusga no Ferrol e também em Padrão, num ano em que o Entrudo era intensamente comemorado e noticiado por toda a Galiza (Gaceta de Galicia, 1892b). Já em 1906 a Tuna Viguesa, formada por 40 membros do alunado da Escola Superior de Indústrias e dirigida por Ramon Castro, organizava uma viagem ao Porto, que seria a sua primeira viagem (Noticiero de Vigo, 1906a):

Cuando recientemente estuvo en Vigo la tuna del Grupo Académico [do Porto], los alumnos de la Escuela prometieron á sus compañeros de Portugal devolverles la visita; y á juzgar por el entusiasmo que entre los vigueses reina, la promesa va á ser cumplida en la fecha que hemos mencionado.
La tuna viguesa dará antes de partir un concierto en Vigo y después otro en Oporto, siendo probable que tambien visite Braga.

Da redação da notícia, que se publica em dezembro de 1906, percebe-se que a Tuna do Porto teria estado em Vigo nesse ano ou no anterior. O trabalho de Coelho et al. (2012, p. 219) regista uma viagem a Compostela nesse ano de uma Tuna portuguesa, sem certeza de ser a do Porto, porém parece que poderia ser a aludida nesta notícia que, como era o costume, além de ir até Compostela, à volta passaria por outras cidades galegas, entre elas, Vigo. A Tuna do Instituto Técnico do Porto também se tinha deslocado à Galiza e chegado até ao Ferrol no ano de 1904. Em qualquer uma destas ocasiões as tunas portuguesas poderiam ter atuado, deixando em Vigo as vontades de devolver a visita.

A relação entre a cidade de Vigo e a do Porto era bem estreita, pois no mesmo jornal de 1906 publica-se a notícia do falecimento dum dos membros do Grupo Académico Portuense, Cândido Simões Ferreira. A notícia, escrita com grande delicadeza e carinho, expressa as condolências em nome da redação e direção do jornal galego (Noticiero de Vigo, 1906b).

Referências bibliográficas
  1. Coelho, Eduardo, Silva, Jean Pierre, Sousa, João Paulo e Tavares, Ricardo. (2012). Qvid Tvnae?. A Tuna Estudantil em Portugal. Porto, Viseu e Lisboa: CoSaGaPe.
  2. Crónica de Pontevedra. (1887). Ponte Vedra: 24 de janeiro, p. 3.
  3. El Correo Gallego. (1885a). Ferrol: 14 de janeiro, p. 3.
  4. El Correo Gallego. (1885b). Ferrol: 16 de janeiro, p. 2.
  5. El Correo Gallego. (1886a). Ferrol: 26 de setembro, p. 3.
  6. El Correo Gallego. (1886b). Ferrol: 11 de novembro, p. 4.
  7. El Correo Gallego. (1887). Ferrol: 6 de fevereiro, p. 2.
  8. El Correo Gallego. (1888). Ferrol: 28 de julho, p. 3.
  9. El Correo Gallego. (1892). “La tuna coruñesa”. Ferrol: 28 de fevereiro, p. 2.
  10. El Eco de Galicia. Diario de la tarde. (1895). Lugo: 8 de março, p. 3.
  11. El Eco de Galicia. Revista semanal de ciencias, arte y literatura. (1884). Havana: 13 de janeiro, p. 7.
  12. El Trabajo. (1880). “Gacetillas”. Ourense: 12 de fevereiro, p. 3.
  13. Gaceta de Galicia. (1888). Santiago de Compostela: 18 de agosto, p. 2.
  14. Gaceta de Galicia. (1892a). Santiago de Compostela: 4 de abril, p. 1.
  15. Gaceta de Galicia. (1892b). Santiago de Compostela: 29 de janeiro, p. 2.
  16. La Correspondencia Gallega. (1897). “Tuna pontevedresa”. Ponte Vedra: 7 de dezembro, p. 3.
  17. La Lealtad Gallega. (1895). Ponte Vedra: 22 de fevereiro, p. 3.
  18. Noticiero de Vigo. (1906a). “Tuna viguesa a Oporto”. Vigo: 12 de março, p. 2.
  19. Noticiero de Vigo. (1906b). “Oporto”. Vigo: 12 de março, p. 2.
  20. Villasuso Fernandez, Lucia M. (2013). “Plazas de toros, circos y otras construcciones efímeras de planta centralizada instaladas en A Coruña entre 1850 y 1950”. Anuario Brigantino(36), pp. 385-410.
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